As convulsões febris metem medo. Por isso são, tantas vezes, causa de um tratamento errado e exagerado da febre. Quem já assistiu a uma convulsão sabe que o “espetáculo” não é bonito. Mas é preciso manter a calma e saber o que fazer.
Os músculos do nosso corpo respondem a estímulos que lhes chegam através dos nervos, emanados do cérebro (músculos dependentes da vontade, como os as pernas e braços, língua, etc) ou do tronco cerebral (músculos autónomos, reflexos, como o coração ou o diafragma). Agora imaginemos que, a nível cerebral, são dadas ordens para os músculos ora se contraírem, ora se relaxarem, muito rapidamente, como se alguém se entretivesse a brincar com o “interruptor” e o ligasse e desligasse continuamente. Os músculos entrarão num ciclo rápido de contração/relaxação/contração/relaxação e é isso que dá origem aos sinais tão característicos dos episódios convulsivos: a criança perde a consciência, cai, agita rapidamente os braços e as pernas, deita “espuma” pela boca, perde o controlo dos esfíncteres, etc. O aparecimento destes sinais e sintomas depende desse estímulo cerebral “desorganizado” e inapropriado.
Todos temos um limiar cerebral
Todos temos um limiar de excitação cerebral a partir do qual os estímulos desencadeiam convulsões. Todos podemos, portanto, ter convulsões. O que se passa, todavia, é que a maioria de nós tem um limiar tão alto para as convulsões que os estímulos do dia-a-dia não proporcionam este tipo de reação. Não estamos propriamente “imunes” às convulsões, mas a maioria das pessoas poderá dizer que está muito bem “defendida”.
As crianças, devido à sua imaturidade cerebral, estão mais ou menos a meio caminho – alguns estímulos que no adulto não desencadeiam qualquer tipo de reação podem, em certas crianças, ser causa de convulsões. A febre, sobretudo quando sobe rapidamente, pode ser um desses estímulos.
Convulsões febris: comuns e sem gravidade
Cerca de 4 a 5% das crianças têm convulsões febris, ou seja, para elas a febre é um estímulo suficientemente poderoso para excitar os neurónios e desencadear a tal perda do controlo muscular. Esta situação é mais frequente entre os 18 meses e os 4 anos, embora possa aparecer antes ou depois dessas idades. Há uma certa tendência familiar – em dois terços dos casos é possível identificar episódios semelhantes que ocorreram nos pais ou nos irmãos.
A convulsão aparece precocemente no decurso da doença, geralmente quando a febre está a subir. Há duas doenças que, por ocorrerem nestas idades e estarem associadas a febre alta, se acompanham frequentemente de convulsões febris – a otite média aguda e o exantema súbito (“6ª doença” ou roseola infantum).
As convulsões febris manifestam-se, geralmente, da mesma maneira que o chamado “grande mal epilético”, ou seja, a criança perde a consciência, os braços e as pernas agitam-se, perde o controlo dos esfíncteres e faz chichi, deita “espuma” pela boca, etc. Estes episódios não duram mais de 5 a 10 minutos, mas podem, em raros casos, prolongar-se. Em pouco mais de um terço das crianças, os episódios podem repetir-se uma ou mais vezes, embora o número de casos “crónicos” (mais de cinco episódios) seja muito raro. A probabilidade de se repetir é maior se a idade de início for antes do ano ou se existirem outros casos na família. Por outro lado, quanto mais tempo passa sem se repetir, maiores as probabilidades que isso nunca venha a acontecer.
A ocorrência de convulsões febris NÃO está associada a um maior risco de epilepsia, já que na epilepsia existem áreas cerebrais anormalmente híper-reativas, seja porque existem problemas de ordem genética, seja como sequela de problemas perinatais ou porque a criança sofreu um traumatismo craniano anterior, por exemplo. Pelo contrário, na convulsão febril o que há é uma reação de um cérebro imaturo a um estímulo (febre).
É claro que a afirmação de que se trata apenas de uma convulsão febril tem que ser feita pelos médicos, depois de uma avaliação rigorosa da situação. Não nos podemos esquecer que há outras situações – infeciosas (encefalites, meningites), tumorais, etc – que se acompanham de febre e convulsões mas em que estas não são consequência daquela, ou seja, febre e convulsões são ambas um resultado da doença base. Existem meios científicos para diferenciar umas das outras e, no final da avaliação, o médico poderá afirmar com segurança se se trata de uma convulsão febril ou se existe mais algum problema.