Para quem tem um sono leve, nada mais irritante do que alguém a ressonar por perto. E se esse alguém é nosso filho ou filha, pior se torna, pois, no silêncio da noite, e para além da melodia desagradável que nos impede de dormir, surge a dúvida e o temor de que aquela criança possa ter algum problema respiratório.
Ressonar é quase normal em muitas crianças acima dos dois anos. Cerca de 8 a 10% das crianças ressonam durante a noite em alguma fase da sua vida. Na enorme maioria dos casos, a culpa é das amígdalas ou dos adenoides.
Muitos pais, no entanto, têm dúvidas não só sobre o ressonar em si, como também sobre as atitudes a ter perante esta situação tão frequente. E é um facto que, sendo a maioria das vezes um problema de pouca importância, noutros casos as consequências podem ser mais graves. Por esta razão, criança que ressona deve ser observada pelo médico para que se possam excluir as situações problemáticas. É sobre isto que vamos conversar hoje.
As amígdalas
As amígdalas e os adenoides fazem parte do sistema de defesa do corpo contra as infeções. Funcionam como sentinelas. Por esta razão, encontram-se perto das entradas do corpo, à espera de bactérias ou vírus que queiram entrar. As amígdalas perto da boca, uma de cada lado na garganta e os adenoides na parte de trás do nariz.
Na verdade, só damos pela existência das amígdalas quando estas infetam, situação conhecida por amigdalite. Quando isso acontece, a criança queixa-se de dores de garganta, tem dificuldade em engolir, principalmente alimentos sólidos e, muitas vezes, tem febre. Na observação, o médico encontra umas amígdalas grandes e vermelhas e pode observar umas placas de pus sobre elas. Os gânglios do pescoço estão muitas vezes aumentados como resposta a esta infeção e podem doer quando são palpados. Como tantos pais sabem, uma amigdalite não passa despercebida e deve ser tratada. Muitas vezes, bastam os anti inflamatórios, noutras (menos frequentes) é necessário um antibiótico.
Algumas crianças têm as amígdalas grandes, o que, só por si, não constitui nenhum problema. Amígdalas grandes não se infetam mais do que amígdalas pequenas. O tamanho só tem importância quando, sendo muito exagerado, dificulta a respiração.
Os adenoides
Os adenoides situam-se atrás do nariz. Tal como as amígdalas, a sua função é proteger a criança de infeções e, por esta razão, estão situados perto de uma das entradas do corpo.
Não é sempre evidente quando uma criança tem os adenoides grandes. Eles acompanham o crescimento normal da criança, mas podem tornar-se exagerados entre os 18 meses e os cinco anos de vida. Algumas crianças têm tendência para ter os adenoides grandes quando estão nessas idades, o que deixa de acontecer depois. Os adenoides podem também aumentar muito de tamanho quando a criança fica doente, por exemplo durante uma constipação. Nestas situações, os adenoides podem ficar infetados, situação chamada de «adenoidite».
Existem algumas manifestações que podem levar os pais e o médico a suspeitar de que a criança sofre de um aumento exagerado dos adenoides, como a respiração ser feita pela boca em vez de pelo nariz, ter muitas vezes a boca seca e voz nasalada (fala como se o nariz estivesse entupido). Estas crianças apresentam habitualmente uma respiração ruidosa durante o dia e ressonam durante a noite. Se os adenoides estiverem sempre aumentados, podem provocar outros problemas como sinusites ou otites frequentes e diminuição da capacidade auditiva.
Ao contrário das amígdalas, os adenoides não se conseguem ver num exame de rotina. Apenas podem ser visualizados por um especialista de Otorrino, com a ajuda de alguns instrumentos especializados. Por esta razão, é necessária uma grande atenção às queixas da criança para se poder suspeitar de que algo não está bem.
As pausas de respiração durante o sono
Muitas vezes, existe aumento ao mesmo tempo das amígdalas e dos adenoides. Estas crianças queixam-se de tudo o que vimos atrás e podem apresentar períodos durante a noite em que deixam de respirar, porque as amígdalas e os adenoides conseguem obstruir a totalidade ou grande parte das vias respiratórias. A esta situação os médicos chamam de «apneia obstrutiva do sono». O que acontece é que, durante o sono, por a criança estar mais relaxada, as suas vias respiratórias se tornam mais estreitas, o que combinado com umas amígdalas e adenoides grandes pode provocar a sua obstrução. A criança ressona alto e, subitamente, deixa de respirar por alguns segundos apenas, retomando depois a sua respiração ruidosa. Como podem antever, é uma situação angustiante para os pais. Felizmente, esta situação ocorre em menos de 1% das crianças entre os 18 meses e os cinco anos.
O mais importante em relação ao ressonar não é o ruído em si, mas o que ele pode significar. O ressonar surge como um sinal de alerta que nos obriga a investigar se a criança sofre de apneia obstrutiva do sono. Esta situação, se não for corrigida, leva a que a criança tenha sempre um sono muito agitado, suando muito durante a noite, fazendo com frequência chichi na cama e acordando cansada, irritadiça e com dores de cabeça. Durante o dia, anda sonolenta, o que se reflete no seu comportamento, muitas vezes hiperativo, e no seu rendimento escolar, que vai diminuindo. Nos casos mais prolongados pode mesmo levar a um atraso no seu crescimento normal.
O que fazer se a criança ressona
Para os pais de uma criança que ressona, a primeira coisa a fazer é dizer isso mesmo ao médico que habitualmente a segue. Da mesma forma, devem perguntar à educadora se está tudo bem na escola ou se ela nota alguns problemas de comportamento ou concentração.
Após a observação, o médico pode concluir que existe um aumento exagerado (o termo médico é «hipertrofia») do tamanho das amígdalas ou dos adenoides. Para confirmar este último dado, pode pedir uma radiografia do pescoço.
Se existir hipertrofia dos adenoides de forma aguda e esporádica, por exemplo quando a criança se constipa, o tratamento é feito com antibióticos. Se existir um componente alérgico, principalmente se existirem queixas de rinite, pode ser necessário a criança tomar um xarope com um anti-histamínico ou um spray nasal com um corticoide. E, em princípio, nada mais é necessário.
Se o ressonar é constante e as infeções frequentes, a criança deve ser vista por um especialista de Otorrino. Pode ser necessária alguma terapêutica preventiva e a cirurgia pode ser uma hipótese a considerar. Retirar as amígdalas e adenoides significa tirar à criança algumas das suas defesas. E, por isso, a decisão não deve ser tomada de ânimo leve como o era há alguns anos atrás. Não é uma questão dramática porque outras zonas do corpo tomam então a seu cargo a tarefa de proteção contra as infeções. Mas é uma decisão que deve ser ponderada. A idade da criança é um fator a ter em conta, pois sabemos que os adenoides crescem até cerca dos cinco anos e depois deixam habitualmente de causar problemas. Numa criança de quatro anos e meio, é perfeitamente lógico tentar algum tratamento preventivo com medicamentos antes de decidir operar. Já numa criança de dois anos com múltiplas infeções dos adenoides e perturbação da audição, a cirurgia deve ser seriamente considerada. Cada caso é um caso. De uma forma simples, podemos dizer que uma criança deve ser operada se tiver infeções de adenoides e amígdalas repetidas (mais de quatro a seis por ano), dificuldade em respirar durante o dia, apneia obstrutiva do sono, alterações importantes na fala ou dificuldades de audição provocadas pelo aumento dos adenoides. Em caso de dúvidas, fale com o seu Pediatra.